sexta-feira, 29 de abril de 2011

Parte: V

O vivo e insondável desejo da alma de atormentar-se a si mesma. De violentar sua própria natureza, de fazer o mal pelo próprio mal,  foi o que me levou a continuar, e afinal, a levar a cabo o suplício que afligira ao inofensivo animal.  Uma manhã, a sangue frio,  meti-lhe um nó corredio em torno do pescoço e enforquei-o no galho de uma árvore. Fi-lo com os olhos cheios de lágrimas, com o coração transbordante do mais amargo remorso. Enforquei-o porque sabia que ele me amara, e porque reconhecia que não me dera motivo algum para que me voltasse contra ele. Enforquei-o porque sabia que estava cometendo um pecado – um pecado mortal que comprometia a minha alma imortal, afastando-a, se é que isso é possível, da misericórdia de um Deus infinitamente misericordioso e infinitamente terrível .

Na noite do dia em que foi cometida essa ação tão cruel, fui despertado pelo grito de “fogo!”. As cortinas de minha cama estavam em chamas. Toda a casa ardia. Foi com grande dificuldade que minha mulher, uma criada e eu conseguimos escapar do incêndio. A destruição foi completa. Todos os meus bens terrenos foram tragados pelo fogo, e, então, me entreguei ao desespero.

Não pretendo estabelecer relação alguma entre causa e efeito – entre o desastre e a atrocidade por mim cometida. Mas estou descrevendo uma seqüência de fatos, e não desejo omitir nenhum dos elos dessa cadeia de acontecimento. No dia seguinte ao do incêndio, visitei as ruínas. 

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