quarta-feira, 6 de julho de 2011

Usos da Língua

II - Parte: 

Emprego dos pronomes demonstrativos em relação ao discurso:

Entre dois ou três fatos citados:
·         o primeiro que foi citado: aquele
·         o do meio: esse
·         o último citado: este
Exemplos:
  • Houve uma guerra no mar entre corsários de França e Inglaterra: estes [desnecessário dizer que são os corsários ingleses] venceram aqueles.
  • Música de câmara e ópera são as suas preferidas: esta, porque mexe com seus sentimentos; aquela, pelos efeitos relaxantes.

Uma questão de clareza - É bastante comum o uso de este/esta no lugar do pronome pessoal ele/ela como referência à coisa mais presente, mais à mão, mais próxima (embora já apresentada), quando na oração anterior aparecem outros substantivos que poderiam ser referidos pelo mesmo pronome pessoal, o que poderia confundir o leitor. Exemplos:
  • Quando o rei D. João V faleceu e D. José ocupou o trono, este recorreu a Sebastião José para ser Ministro da Guerra e dos Negócios Estrangeiros.
Dois antecedentes masculinos. Com ‘ele’ no lugar de ‘este’, à primeira vista poderíamos pensar ter D. João V, e não D. José, nomeado Sebastião José (o Marquês de Pombal) ministro.
  • Macpherson dirige sua crítica a Rawls quando este admite serem os princípios éticos da justiça econômica capazes de regular o mercado.
Pelo demonstrativo, fica claro que Rawls é o sujeito de ‘admite’, não Macpherson.
  • Há necessidade de romper com o conhecimento do passado e, em consequência dessa ruptura, torna-se inevitável a retificação da linguagem para que esta se torne adequada à nova ciência.
O pronome ‘ela’ no lugar de ‘esta’ não nos permitiria saber se o autor estava fazendo referência a ‘linguagem’, ‘retificação’ ou ‘ruptura’.

Quando os substantivos antecedentes pertencerem a número e gênero diversos ou quando não houver ambiguidade na frase, é melhor, mais adequado e correto usar o pronome pessoal ele(s) ou ela(s) em vez do demonstrativo:
  • Bachelard, no que se refere à necessidade de superação de obstáculos, alerta que eles não têm origem externa ao ato de conhecer. [e não ‘estes’]
  • Essa concepção de ensino não constitui novidade, a ponto de certos autores aludirem a ela como um aforismo. [desnecessário dizer ‘esta’]
  • O metal, aquecendo-se progressivamente com o aumento da corrente, deve derreter quando ela ultrapassar 10% de um valor prescrito.
Mais um detalhe: ao se referirem a elemento anterior mais próximo, os pronomes este(s) / esta(s) são encontrados também em combinação com o termo ‘último’:

Preocupa-se o autor com a escrita como processo, e não como literatura ou como texto a ser linguisticamente analisado. Aliás, neste último caso não se leva em consideração o tipo de processo..."

Cabe mencionar ainda que no Brasil as editoras, principalmente, não estão sendo demasiadamente rigorosas com o uso dos demonstrativos (a não ser na questão de lugar e tempo), porque no aspecto de ‘localização do discurso’ muitas vezes a distinção entre o que é ‘mencionado anteriormente’ e o que é ‘lugar/tempo’ é pouco perceptível. Por exemplo, num texto em que vários artigos de lei estão sendo citados, o autor pode preferir dizer este artigo ao se referir a um já citado (quando então usaria esse artigo) porque ele está justamente tratando "deste último", do mais próximo (lugar), do que está presente naquele momento (tempo).

Também no caso de uma tese em que se fala de uma empresa ou pessoas pesquisadas, pode-se escrever "esta empresa" ou "estas alunas" mesmo tendo sido elas mencionadas antes - no parágrafo anterior, digamos -, desde que se pense nelas como "as alunas tratadas aqui, nesta pesquisa", ou "a empresa de que se fala neste trabalho, aqui e agora". São casos em que a escolha depende do ponto de vista de quem escreve.

Sobre a autora:
·         Maria Tereza de Queiroz Piacentini é catarinense, professora de Inglês e Português, revisora de textos e redatora de correspondência oficial há mais de vinte anos. Em 1989 foi responsável pela revisão gramatical da Constituição do Estado de Santa Catarina e no ano seguinte publicou artigos sobre questões vernáculas em diversos jornais. Retoma agora a publicação de colunas semanais com temas atualizados, em vista da experiência adquirida e das inúmeras consultas que lhe têm feito pessoas de todo o País depois que lançou o livro Só Vírgula - Método fácil em 20 lições (UFSCar, 1996, 164p.). Também teve publicados, em 1986, dez módulos da Instituição Técnica Programada - ITP, Português para Redação, edição esgotada.
Hompege:
 www.linguabrasil.com.br

Matéria publicada em 01/08/2001   - Edição Número 24

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